quarta-feira, 22 de abril de 2020

A crise e a cidade, por Fernando Monteiro

Crônica



A crise e a cidade
por Fernando Monteiro

A cidade, seja qual for a sua espacialidade ou territorialidade, é dotada de humanidade. É, justamente por isso que a cidade condiz com aquilo que fomos, somos e buscamos ser. A cidade é materialidade das nossas ações e realizações, fruto de períodos históricos e sociais que consigo carregam processos condicionantes que moldam cotidianamente a forma de se produzir a vida em concretude.

Em tempos de crise, é normal que a cidade transpareça o medo e o alvoroço. O medo daqueles que temem qualquer saturação das estruturas de suas vidas e o alvoroço daqueles que não temem perder enquanto não perdem nada.

Carregados de sentimentos, desejos e revoltas, esses sujeitos que compõem a cidade trazem em si ideologias, interesses e práticas que aos poucos moldam a cidade parte a parte, conforme suas respectivas ideias e visões de mundo.

Como parte desse corpo social que compõe a cidade, em tempos de crises como estamos a vivenciar, me encontro dividido entre o otimismo e o pessimismo. É claro que uma crise não é apenas um momento crítico, ela possui uma origem que pode ser de origem econômica, social, político ou biossocial. O que importa aqui é que, seja qual for a instância crítica que estamos a passar, há inúmeros impactos na vida desses sujeitos que estão a construir e humanizar a cidade dia após dia. É saber também que a crise não é sentida da mesma forma por todos e que ela pode ser muito pior para muitos, ao mesmo tempo que pode não surtir tanto efeito para poucos. Na porta de muitos, a crise bate e os expulsam para as ruas pela necessidade de garantirem as condições necessárias de reprodução de suas vidas, enquanto que, para outros, a crise apenas solicita que os mesmos fiquem em suas casas. 

O que me faz lembrar do que o velho Marx diz, ao enxergar que, as crises são momentos de violentas soluções, quase sempre momentâneas, das contradições já existentes na realidade, e que as razões de seus acontecimentos é a busca por equilíbrio ao momento perturbado. Mas que isso não é pensar de forma otimista, e sim se colocar a compreender as manifestações críticas do momento em questão. 

Me faço valer das palavras de João Manoel Cardoso de Mello, quando ele diz não haver razão para otimismos. Que o otimismo em momentos tão dramáticos da vida nacional não serve para nada, apenas de consolo aos medíocres. 

A cidade como forma concreta da sociedade capitalista em devir, mesmo em crise e doente por conta de uma pandemia, é rica de sentimentos humanos e possibilidades, mesmo que essas possibilidades não se manifestem no agora.

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