domingo, 31 de maio de 2020

Teses sobre a questão militar e a crise capitalista, por Gabriel Henrique

Coluna Conjuntura Marxista

La Internacional (1930), de Otto Griebel.

Teses sobre a questão militar e a crise capitalista
Por Gabriel Henrique

1.  A declaração de Eduardo Bolsonaro na quinta-feira (28/05) [1] mostrou ao público em geral algo que, nos últimos anos, vem se mostrando de uma maneira cada vez mais clara, mas que antes se escondia sob o veu do republicanismo: a emergência das Forças Armadas [2] na política nacional como uma espécie de “poder moderador”;

2. A bem da verdade, as Forças Armadas nunca deixaram de desempenhar esse papel na política nacional. A Lei de Segurança Nacional de Figueiredo, recepcionada pela CF/88, é somente a expressão jurídica de uma influência no ordenamento político civil que extrapola as funções tidas como básicas dos militares, que passam a exercer um papel “moderador” da política nacional a qualquer tempo, como um Deus ex machina da política brasileira. Não surpreende então que interpretações como a de Ives Gandra [3], de que o art.142 da CF/88 legaria esse papel moderador às Forças Armadas, sejam possíveis.

3. Mais do que um "simples" papel moderador, poderíamos dizer que o nosso ordenamento jurídico literalmente permite às Forças Armadas que elas exerçam verdadeiro poder interventor na política nacional.

4. Destarte isto, o papel de Deus ex machina das Forças Armadas foi um tanto quanto modificado. Não porque os militares se deram conta da contradição inerente a cartas republicanas de se prever sua própria supressão, mas sim porque, no governo Bolsonaro, foram de eventuais interventores externos à própria estrutura burocrática do executivo brasileiro -- estrutura que conhecem tanto quanto dominam a arte de capinar: de Deus ex machina transformam-se num Deus in machina, atuando efetivamente no primeiro escalão da política executiva nacional.

5. Nos parece muito evidente que os militares se encontram em posição muito confortável no momento; pois, apesar de terem desembarcado em massa no corpo burocrático do Estado brasileiro por meio da gestão de Jair Bolsonaro, os militares podem, a qualquer tempo, por meio de alguma manobra institucional, jogar Bolsonaro às baratas e promover um governo de “conciliação nacional” por meio do vice-presidente Mourão; esse é o motivo de assegurar a legitimidade jurídica do papel interventor das Forças Armadas com base em interpretações de dispositivos presentes em nosso ordenamento jurídico. 

6. Como atores políticos, ao mesmo tempo em que, organicamente, organiza a barbárie da sociedade brasileira estando no primeiro escalão do executivo federal, quando a bomba econômica e social explodir apresentam-se como a solução falsamente externa, como reserva moral da sociedade brasileira, impondo uma ruptura que juridicamente se mostra sobre a farsa do republicanismo, seja como impeachment, seja com base no art. 142 da CF/88.

7. Não obstante, sabemos que uma mudança como essa só poderia sobrevir por meio de uma crise política completa, do aumento da crise econômica e do subsequente derretimento do governo; no atual quadro conjuntural, mesmo diante da crescente perda de popularidade do governo, este ainda mantém apoio de importantes frações da burguesia nacional, tal como a burguesia comercial, por exemplo. Daí que uma eventual queda de Jair Bolsonaro deve vir, quase que necessariamente, acompanhada de um esvaziamento completo dessa sua base de apoio; por enquanto essas importantes frações da burguesia nacional permanecem com o presidente.

8. O veredito parece mesmo que será dado pela agudeza da crise capitalista, que começa a soar forte em território nacional, com a explosão do número de desempregados [4] e com a recessão que bate à porta [5]. Somente agora a consciência burguesa parece ter entendido que não adianta afrouxar a quarentena nos Estados, pois não há demanda com a retração da renda dos trabalhadores e tampouco há oferta como havia anteriormente, visto que a maior parte dos pequenos proprietários foi à falência -- o crédito necessário para sua subsistência não fora fornecido pelo Governo Federal -- e seus capitais foram conscientemente jogado na mão dos monopólios [6]. Para se manter a taxa de lucro, recorre-se a mais valia absoluta. Arrocha-se o trabalhador. Flexibiliza-se ainda mais a legislação trabalhista. A opção keynesiana, queridinha de liberais em tempos de crise, no atual estágio do modo de produção capitalista, parece só se aplicar aos países centrais do capitalismo. Aos países dependentes, resta a política neoliberal, que tem na figura de Paulo Guedes a única unanimidade hoje dentro da burguesia nacional.

9. A disputa pelo comando político da Polícia Federal por meio do judiciário (representado na figura do STF e por setores lavajatistas) com o executivo federal  (representado notadamente pelo bolsonarismo e pelos militares que, por enquanto, ocupam seu governo) é a aparência de um processo que representam nada mais que uma encarniçada disputa em torno da gestão da crise capitalista.

10. Com as taxas de lucro em visível declínio, a adoção da política neoliberal de Guedes parece se impor cada vez mais como uma necessidade, independentemente do que venha a ocorrer no terreno da disputa política no seio da burguesia brasileira. Não à toa, Guedes parece gozar de certo prestígio com praticamente todos os setores do poder burguês no Brasil, que vão desde os militares até a setores lavajatistas representados na figura de Sérgio Moro; por esse motivo ele aparece, por várias vezes, pedindo “união nacional” em busca do retorno do crescimento econômico [7]; tal pedido não quer dizer outra coisa senão de que a disputa entre as frações da burguesia brasileira não pode prejudicar as medidas neoliberais para retomada das taxas de lucro.

11. Não temos dúvida de que, se o Governo Bolsonaro perder a capacidade de gerir a crise capitalista de modo que possa aprovar as reformas necessárias no Congresso Nacional para a retomada da acumulação de capital no Brasil, os militarem não perderão tempo em se descolar da imagem do presidente e marchar em direção à sua deposição. Por esse motivo o presidente do Senado Federal, David Alcolumbre e o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, relutam em entrar em conflito com o Bolsonaro, mesmo quando atacados; o que eles querem, na verdade, é evitar que o acirramento da disputa política no seio mesmo do poder burguês possa interferir na aprovação das reformas liberais e anti-nacionais de Guedes, e é por esse motivo que retomam a todo o tempo o discurso reformista em prol das reformas.

12. O poder moderador exercido pelas Forças Armadas é a de um Deus ex machina cujas mãos invisíveis aos incautos ou aos desonestos é manipulada pelas potências imperialistas do capitalismo, que tem nas Forças Armadas dos países periféricos, desde o auge da Guerra Fria, um de seus mais influentes instrumentos de poder.

13. Pouco importa, por conseguinte, a forma com que o Estado se manifesta, a tutela militar tem apenas um objetivo: a manutenção do subdesenvolvimento brasileiro. Que isso se mantenha com o presidencialismo de coalizão da "Nova República" em decadência, ou através de um processo de impeachment, ou se recorrendo ao art. 142 da CF/88 revestindo de legalidade 1964, a forma de manifestação esconde uma essência e objetivo comum.

14. Independentemente do caminhar da conjuntura e de quem saia vitorioso na luta pela gestão da crise capitalista, nos parece cada vez mais certo que há dois pontos arquimedianos: 1) a política ultraliberal e anti-nacional será a política econômica do Executivo Federal, qualquer que seja o desenrolar da conjuntura e 2) os militares exercem um papel externo de controle da política econômica brasileira, seguindo os ditames do capitalismo central.  Nesse sentido, a permanência ou não permanência de Guedes não poria fim a essa política econômica, mas significaria apenas a sua atenuação; acrescentamos, no entanto, que a conjuntura não parece caminhar nesse sentido e que, aparentemente, toda a burguesia nacional está  “fechada” com Guedes – mesmo que ainda existam setores keynesianos em algumas frações da burguesia brasileira.




Notas
[1] https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/05/28/eduardo-bolsonaro-propoe-uso-das-forcas-armadas-para-restabelecer-harmonia-de-poderes-zeram-o-jogo-e-depois-volta-o-jogo-democratico.ghtml
[2] Nos referimos aqui e ao longo do texto às Forças Armadas e aos "militares" genericamente, destarte saibamos que o principal operador político destes é o Exército. Fazemos isso como recurso didático para as teses aqui expostas. Bem sabemos que as Forças Armadas não são um bloco harmônico, único, livre de tensões e contradições.
[3] https://www.conjur.com.br/2020-mai-28/ives-gandra-artigo-142-constituicao-brasileira
[4] https://economia.uol.com.br/empregos-e-carreiras/noticias/redacao/2020/05/28/desemprego-pnad-ibge.htm
[5] https://g1.globo.com/economia/noticia/2020/05/29/com-pandemia-pib-do-brasil-encolhe-15percent-no-1o-trimestre.ghtml
[6] https://valor.globo.com/brasil/noticia/2020/05/29/ibge-crise-econmica-causada-por-covid-19-diferente-de-todas-anteriores.ghtml
[7] https://g1.globo.com/economia/noticia/2020/05/29/em-dia-de-tombo-do-pib-guedes-pede-solidariedade-para-retomada-rapida-da-economia.ghtml

A habitação e a reprodução da cidade, Por Fellipe Barbosa

Crônica

A habitação e a reprodução da cidade
Por Fellipe Barbosa

A cidade é um dos organismos mais fascinantes de toda a história da humanidade. No seu âmago manifestam-se todas as contradições do ser. É heterogênea, suja, conflitante. O grande e saudoso geógrafo amazonense José Aldemir de Oliveira cravava acertadamente em suas falas que “a cidade fede a podre”. Para mim, é impossível dissociar a cidade do seu aspecto humano. Não há necessidade de ser um acadêmico dos estudos urbanos para saber disso, e a razão é simples: a cidade se manifesta. Ela fala. Suas palavras, entretanto, não saem de uma só boca. Saem das bocas de todos os indivíduos que a habitam. São distintas vozes, diferentes sonhos e clamores.

Sob a lógica do período colonial, funda-se Manaus. Sob a lógica do capitalismo, ela cresce e, num perverso movimento, floresce enquanto apodrece. O que antes era trilha agora é rua, asfalto preto e quente. O que era igarapé agora é o aterro, que nas torrenciais chuvas se rompe num controverso “água dura e terra mole”, que leva na correnteza as lágrimas daqueles que em meio a constante tragédia que se repete religiosamente, ano após ano, desesperam-se no anseio de atender a mais básica das demandas urbanas:  morar. Chega a indústria e os que menos podem são paulatinamente enxotados. Do rio para as periferias. Manaus é agora a metrópole da Amazônia e não há mais espaço para a madeira e a maromba, agora é aço e concreto. Mas, ainda que belas, as artimanhas do discurso não são capazes de suprimir a brutal diferença entre as castas. Diz-me onde moras que te direi quem és. 

É nesse contexto que a cidade se reproduz, a partir de forças que não estão no cá, mas no acolá. O mercado imobiliário, muito esperto, ciente do nosso medo e aliado aos nossos sonhos mais medíocres sobe a espiga dentro do cercadinho onde estaremos condenados a viver uma vida estéril. Onde o quotidiano é produzido artificialmente, de dentro de nossos automóveis, de dentro do elevador, ou na quadra de esportes dificilmente ocupada pelos vizinhos que não se conhecem. Agora temos uma Manaus verdadeiramente próspera, olha aqui na foto a quantidade de edifícios! Parece até que estamos em Miami. Assim, encaixam-se as peças do lego. Ordenadamente surgem as tão sonhadas áreas nobres. Se a história pode nos ensinar com clareza o que está ao passado, exercitemos a imaginação. Transportemo-nos ao tempo e aos lugares dos déspotas e suas cortes. A grande verdade é que há pouco valor na nobreza formalmente instituída. 

Sob os para-raios não há medo. Não há lama na colcha de cama. Não há receio. No Central Park Residence, não estamos na Amazônia. Transportamo-nos a uma Manhattan produzida como um arquiteto faz uma maquete. Ao custo da bagatela de quase ou mais de um milhão de reais. Ao redor de tanta ordem, há o refugo. Vislumbra-se da janela alta as luzes do bairro pobre. Apesar de visível, a pobreza está mais distante do que o aeroporto. Os instrumentos normativos regulam para uma cidade que não existe e são mera formalidade. Estes são facilmente subvertidos ou solenemente ignorados, desde que haja o faz-me rir. Entretanto, mesmo enquanto alteramos nocivamente o curso de nossos ventos e a temperatura do ambiente ao nosso redor, não conseguimos impedir a construção da nossa verdadeira identidade.  Ela esteve o tempo todo no bairro, onde a Dona Neuza pede ao neto para ir na padaria pois sentiu o cheiro do pão. Ela sempre esteve dentro do ônibus, ou vendendo lanche na rua em uma bicicleta cargueira.

sábado, 30 de maio de 2020

Reflexões acerca da conjuntura brasileira, Por Gabriel Henrique

Coluna Conjuntura Marxista



Reflexões acerca da conjuntura brasileira*
Por Gabriel Henrique

A crise capitalista mundial, agravada pela pandemia do Coronavírus, impôs um novo desafio à burguesia brasileira, com as taxas de lucro em evidente queda, o que fazer para retomá-las? Trata-se da questão fulcral em torno da qual gira todo o debate acerca da crise econômica e do isolamento social. É evidente que a posição “negacionista” de Bolsonaro não veio à sua cabeça ex nihilo, ela representa, antes de tudo, o afã da coalização burguesa no poder; é também verdade que a burguesia não quer ver colada a si essa face cruel que, de modo evidente, quer a “volta à normalidade” porque necessita evitar o ocaso de seus negócios, mesmo que isso signifique a morte de milhões de brasileiros e o colapso do sistema de saúde. Não à toa, têm investido em marketing “solidário”, como se pode ver naquele quadro do JN “Solidariedade S.A”, cuja principal função é promover determinadas empresas e passar a imagem de “responsabilidade social” de certa gama do empresariado brasileiro. 

No entanto, o vídeo da reunião ministerial divulgado na última sexta-feira (22/05) parece ter exposto todas as vísceras do programa econômico da burguesia brasileira quando Paulo Guedes, do alto da indigência típica do liberalismo da periferia do capitalismo, brada que “tem que vender essa p*** logo” se referindo ao Banco do Brasil. Apesar de, há cerca de 1 mês, o ministro da Casa Civil Braga Netto ter apresentado à imprensa o programa “Pro-Brasil”, uma espécie de keynesianismo requentado - que parece ainda gozar de certo prestígio de algumas frações da burguesia brasileira e com parte dos militares – cujo eixos girariam em torno de “medidas estruturantes” e parcerias público-privadas”, a opção da burguesia brasileira parece mesmo ir em direção ao neoliberalismo de Guedes. 

Tanto é assim que as absurdas falas de Guedes não tiveram praticamente nenhum espaço nos principais jornais da TV aberta e nos jornais impressos do país, elas foram calculadamente apagadas do debate público. As notícias de que o vídeo da reunião fora bem recebida pelos bancos privados [1], e pelo “mercado”[2] em geral são prova inconteste de que o programa de Guedes é o escolhido pela burguesia brasileira; a notícia de que o Brasil deverá tomar empréstimos com bancos estrangeiros [3] é mais uma prova de que o caminho a ser seguido para retomada da taxa de lucro no Brasil será o da venda completa do patrimônio público, a concessão ao capital financeiro internacional, o aumento do número de desempregados com a consequente queda dos salários, etc. 

Um programa neoliberal como esse não é mera “opção” da burguesia brasileira, ele é uma necessidade imposta pela atual crise. A velha fórmula keynesiana não parece ser mais possível no atual quadro conjuntural (e creio que mesmo que fosse possível ele seria insuficiente para resolver a atual crise), as condições históricas que permitiram seu surgimento já não existem mais há muito tempo e todas as “conquistas” do assim chamado Welfare State – que não foram nada mais nada menos que circunstâncias fornecidas pela luta de classes, como a própria existência da URSS, da luta anticolonial, e de revoluções ao redor do mundo, como a Cubana, Chinesa, etc. - foram continuamente destruídas ou, pelo menos, atacadas pelo neoliberalismo, uma necessidade imposta pela crise que atingiu o mundo nos anos 70. Desde lá as burguesias ao redor do mundo não desenvolveram outro instrumental teórico e seguem com sua aposta dobrada no neoliberalismo, cada vez mais radical, a depender da necessidade da crise. É bem possível que um novo padrão de acumulação capitalista possa surgir nas próximas décadas, mas o que vemos hoje é o esgotamento cada vez maior da dinâmica capitalista mundial, bastante afetada pela interrupção da circulação de mercadorias provocada pelo Coronavírus, que impediu qualquer tentativa de retomada rápida dos lucros, cuja necessidade de extração de mais-valia é cada vez maior, especialmente nos países periféricos.  

O debate acerca da autonomia da polícia federal, do racha entre Moro e Bolsonaro, da “independência e harmonia” entre os poderes, etc. não é nada mais que o debate entre liberalismo de esquerda e liberalismo de direita. Na verdade, o que esse liberalismo cínico gostaria de ter no meilleur des mondes possibles é um Bolsonaro à français, um pouco mais refinado e menos errático na condução do seu programa político-econômico. 

O Brasil que nossa burguesia pretende construir é um Brasil de miseráveis, cuja força de trabalho seja barata e que esteja amplamente disponível no mercado com normas legais o mais flexíveis possível, com um Estado à disposição para ser saqueado quando necessário e submisso ao imperialismo. Não há outro caminho para o Brasil senão a Revolução Brasileira, cuja debate está mais do que na ordem do dia.



[1.] https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2020/05/23/bancos-empresarios-reuniao-ministerial-austeridade-fiscal-paulo-guedes.htm
[2.] https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2020/05/25/programa-liberal-ecoa-tanto-quanto-palavroes-dizem-economistas.htm 
[3]. https://oglobo.globo.com/economia/governo-deve-pedir-emprestimo-de-us-4-bi-organismos-internacionais-para-pagar-auxilio-de-600-24442261

*Escrito em 24/05/2020

quarta-feira, 27 de maio de 2020

Política, Transporte e a Pandemia de COVID-19: breves comentários, por Thiago Oliveira Neto & Tatiana de Souza Leite Garcia



Política, Transporte e a Pandemia de COVID-19: breves comentários 
Por Thiago Oliveira Neto 
e Tatiana de Souza Leite Garcia

A pandemia da Covid-19, nos primeiros meses de 2020, ocasionou transformações brutais na circulação de pessoas com o estabelecimento de barreiras para reduzir a circulação dentro dos municípios, entre as cidades e entre países, propiciando mudanças nos fluxos em diversas escalas. 

Essa pandemia demonstrou, claramente, que os interesses hegemônicos buscaram por meio de narrativas de resistência frente a parada parcial ou total das atividades, para que não afetassem seus rendimentos provenientes de empreendimentos e serviços. 

Essa contenção forçada de parte da circulação das pessoas para fins de evitar a propagação do vírus que causa a Covid-19 e a consequência de saturação dos sistemas de saúde, notadamente nos hospitais, decorre da relação entre as pessoas circulando sem os devidos cuidados de proteção individual, independentemente de estarem ou não contaminadas e com ou sem sintomas, e a expansão dos casos positivos em todas as escalas.

Em escala global, houve diversos reflexos da parada parcial ou total das atividades econômicas. A rigor, o problema da paralisação das atividades não impacta somente na escala local, primeiro porque ocorreu em quase todos os países do mundo, e segundo, porque diversos sistemas produtivos dependem das redes globais de circulação de insumos, de produtos até chegar aos mercados consumidores, que também foram impactados com a tentativa de controle dos fluxos de pessoas. É um efeito em cadeia. 

Na escala nacional, podemos apontar o contexto político vivenciado no Brasil, em que se denota a existência de algumas fragilidades e afetam diretamente o combate da pandemia. 

O primeiro consiste no estabelecimento de ações não coordenadas em nível nacional, sendo que cada estado ou município estabelecem um conjunto de diretrizes sobre o funcionamento das atividades, algo que foi propiciado pela constituição de 1988 delegando a esses entes poderes de reger leis e normais para diferentes frações territoriais. 

O segundo aspecto consiste no descompasso e incapacidade de coordenar ações por parte de alguns atores políticos, considerando a importância da liderança política que o presidência de um país democrático deveria exercer visando ao bem estar de toda sociedade, mas na atual conjuntura, o presidente do Brasil lidera negativamente porque nega a gravidade da pandemia, não dialoga com todas as áreas que compõe a comunidade científica especializada e entra em conflito com as ações de estados e municípios, através de seus discursos públicas e pelas redes sociais. 

As ações não coordenadas e os discursos ocasionaram um terceiro e emblemático problema, uma “crise” federativa com embates entre atores políticos de estados com a presidência, deixando claro, a incapacidade de governabilidade e de gestão coletiva de ações para conter a pandemia. 

Por fim, o quarto aspecto, o sistema de saúde público e gratuito que apesar de anos de precarização, mostrou-se importante no momento atual; mas as condições insatisfatórias existentes antes da pandemia constituem em um grave erro da promoção do sucateamento desse importante serviço, fundamental para a sociedade e para a economia, principalmente quando pensamos em grandes cadeias produtivas - circuitos espaciais da produção - que envolvem laboratórios instalados no Brasil e produção de medicamentos, vacinas, equipamentos médicos e hospitalares. 

Além desses problemas que englobam esferas políticas, temos ainda as ações orquestradas de grupos que buscam, a todo custo, manter ou retornar as atividades, como aconteciam nos meses de janeiro e início de fevereiro. A defesa da volta ao normal e a justificativa que empresas e pessoas morrerão se não voltarem as atividades produtivas -econômicas. Se por um lado, presenciamos os interesses do capital hegemônico em que seus atores buscam a manutenção de seus lucros a qualquer custo; por outro lado, tem um movimento de geração de desinformações constituído na criação de inverdades em arquivo de mídias -imagens, áudios e vídeos- com divulgação em redes sociais -WhatsApp, Facebook e Instagram. Esses dois movimentos são frutos de um único objetivo, a busca pela manutenção das atividades e dos lucros, mesmo em momento de expansão da pandemia, baseado na ignorância, no individualismo, na competição. 

Pensamos que um dos problemas atuais da sociedade é a dificuldade das pessoas em compreenderem que os processos e os fenômenos não se restringem a escala local. Na real, ocorrem em outras escalas e, muitas vezes, impactam diversos lugares e pessoas, no mundo todo. 

Circulação, transportes e informações: Vírus e Fake News. 
A frenética circulação de pessoas, cargas e informações impulsionada pelos avanços do meio técnico-científico-informacional e a necessidade, cada vez maior, de realizar tarefas e consumos em menor tempo formou diversas redes de fluxos conectados com os mais diversos lugares do planeta. Esses fluxos intensos de deslocamentos de centenas de pessoas pelos transporte aéreo, ocasionou a difusão geográfica em tempo recorde que, inicialmente, estava na cidade de Wuhan, na China, para os principais aeroportos do mundo, os hubs centrais e, posteriormente, para os hubs secundários em vários países, inclusive no Brasil, pelos aeroportos de Guarulhos e de Fortaleza. 

Essa capilaridade das redes e rapidez dos fluxos foram peças fundamentais para a propagação da Covid-19, com os deslocamentos de pessoas sintomáticas e assintomáticas, partindo das áreas com casos de infectados e chegando em outras que ainda não tinham infectados. Esses primeiros contágios apresentam um aspecto interessante, parte dos contaminados dispunham de condições de renda, no mínimo, que pode ser considerada como classe média, dada a condição de viagem aérea internacional, seja a trabalho ou turismo. Não é um determinismo socioeconômico e, sim, uma observação para entender a dispersão geográfica da pandemia a partir da China, de forma tão rápida, chegando aos grandes centros urbanos de outras regiões do mundo.

O problema que se evidencia é que a propagação do vírus contraído pelas pessoas de classe média que viajaram para o exterior e ao retornarem carregavam em seus corpos o vírus SARS-COV-2, e ao continuarem com suas atividades diárias de circular, ter contato com outras pessoas no trabalho, restaurantes, academia, confraternizações familiares e com amigos, contatos com funcionários, prestados de serviços, entregadores de comida, dentre outras formas de contato social, desencadearam a propagação comunitária, mas que com o agravante de que as pessoas com baixo nível socioeconômicos que foram contaminadas dentro de seu país, não possuem recursos para tratamento e cuidados no sistema de saúde privado, como parte da classe média que dispõem desse benefício. 

Esse problema se agrava ainda mais, pela existência de problemas sociais como segregações espaciais, falta de agua encanada e de coleta de esgoto e lixo, moradias precárias, má alimentação em qualidade e quantidade mínimas ideais, vícios etc., condições que tornam difíceis medidas de prevenção, distanciamento social, sobrevivência econômica e facilitam a propagação do vírus, ainda mais violenta, que resulta em números de vítimas cada vez maiores em nossas cidades. 

Com os avanços das técnicas e tecnologias informacionais, a produção de informações não está mais centralizada em alguns atores, como empresas de rádio e televisão, de modo que possibilitou a criação de meios de comunicação alternativos e a geração/propagação de informações pelos movimentos sociais, pessoas das comunidades e independentes, levando-as para as mãos, os olhos e os ouvidos de milhares, em diversos lugares. Isso corroborou positivamente para uma maior produção e divulgação de conteúdo digital.

No entanto, concomitantemente, presenciamos também a produção de informações por diversos atores que as utilizam para divulgar conteúdos que geram desinformação, ou seja, fake news, inverdades, deturpação de dados reais. A informação fraudulenta não é uma novidade exclusiva do momento atual, mas se apresenta altamente danosa, perversa e escancarada.

Já a grande mídia, custeada pelos grupos capitalistas, e historicamente capaz de influenciar as massas, se apresenta politicamente de dois lados. De um lado divulga contraposições aos pronunciamentos do presidente do Brasil, mostra as situações de colapso dos hospitais, cemitérios e descomprometimento de pessoas em diversas cidades brasileiras, como tentativa de conscientizar para que cumpram o distanciamento social e fiquem em casa. Mas também tem aquelas emissoras e programas que apoiam o negacionismo científico, subdimensionam a gravidade da pandemia e reforçam a aclamação para o retorno das atividades econômicas e da circulação das pessoas. Ambas sustentam suas audiências na desgraça alheia. Ambas dependem da venda de espaços publicitários e, se forem digitais, de terem mais acessos, likes ou visualizações. A informação também é mercadoria! 

Desigualdades de acessos a saúde e educação 
Com a pandemia da Covid-19 dois serviços relevantes para a sociedade demonstraram que são oferecidos de forma desiguais: saúde e educação.

O primeiro que é o atendimento de saúde, atualmente se encontra saturado, face a dificuldade de atender a todas as pessoas, seja pela falta ou inexistência de equipamentos e de recursos humanos para atendê-las satisfatoriamente, ocasionando constrangimentos, choros e mortes. Além disso, o acesso é desigual no acesso, pois nem todos possuem meios para chegar a um hospital ou posto de saúde, especialmente aquelas pessoas que moram na zona rural, em pequenos vilarejos ou na Amazônia, onde o fator distância é a primeira barreira a ser enfrentada, pois demoram algumas horas ou até dias de viagem. Além disso, a escassez de recursos financeiros para custear o deslocamento é outro aspecto pouco observado.

A transformação da saúde em mercadoria, destinada para o consumo de algumas poucas pessoas, está atrelada aos deslocamentos rápidos do paciente em aeronaves, atendimento em Unidade de Terapia Intensiva-UTI e tratamento com equipe multi-especializada. Mas felizmente, no Brasil, existem hospitais de atendimento ao público em geral que dispõe dessa estrutura técnica, tecnológica e humana, como o Hospital das Clínicas, Hospital Emílio Ribas, dentre outros.

É inegável a importância nacional e reconhecimento do Sistema Único de Saúde – SUS, o único sistema de saúde pública do mundo que atende de forma universal e gratuita mais de 100 milhões de pessoas; sendo que toda população brasileira, em torno de 200 milhões, sem contar os estrangeiros que moram aqui que são em torno de um milhão, que também usufruem desse sistema público quando buscam postos de vacinação, medicações de alto custo, fila única de transplantes de órgãos etc. 

O problema do SUS é a má administração e falta de recursos financeiros, materiais e humanos, agravados com os desvios de verbas e casos de corrupções, que levam a outros problemas, como  o longo tempo de espera para atendimento, falta de leitos, equipamentos, médicos e medicações. 

Outro acesso desigual é o ensino. Enquanto muitas escolas de ensino fundamental e médio particulares transferiram suas aulas presenciais para o formato de ensino a distância mediado por tecnologia, criou possibilidades, mas também sobrecargas. Para os profissionais de ensino, em curtíssimo tempo, precisaram repensar suas aulas, atividades formativas e avaliativas, a aprender e lidar com as novas tecnologias e plataformas digitais, ocasionando a geração de mais trabalhos aos profissionais de ensino, e consequentemente, menos tempo livre para suas opções pessoais. Para os estudantes com acesso à internet com boa velocidade e equipamentos técnicos, estão conseguindo acompanhar as aulas e realizar as atividades de consolidação de aprendizagem. 

No entanto, nas escolas públicas existe uma enorme assimetria entre aqueles que têm e os que não têm acesso a celular, computador e internet, ou seja, os meios técnicos e os fluxos de informações necessários para o ensino associado com o distanciamento social, evidenciando que as técnicas que propiciam a circulação de informações e dados estão distribuídas de forma desigual no território. 

Uni-vos pela construção de ações políticas coordenadas!
Um dos maiores problemas no Brasil frente a pandemia é a crise federativa marcada pelas ações e discursos não coordenados entre prefeitos, governadores e presidente.

Nesse contexto, entre o momento de chegada e expansão da pandemia em todas as regiões do Brasil, diversas ações deveriam ter sido realizadas de forma coordenadas e alinhadas, visando sua potencialização para conseguirem, efetivamente, evitar novas contaminações, a saturação dos hospitais e as milhares de mortes.

Pode-se apontar algumas medidas que são cruciais e que deveriam estar alinhadas entre as instâncias públicas municipais, estaduais e federais, como a redução da circulação de pessoas em âmbito terrestre, aéreo, fluvial e marítimo, algo que ocorreu tardiamente; a conscientização das pessoas para adotarem como hábito o uso de máscaras e a limpeza das mãos e objetos; e a distribuição de máscaras e álcool em gel para as pessoas pobres, que não tem condições de comprar esses materiais; a desinfecção constante dos veículos e dos terminais de transporte coletivo; a readequação dos horários do comércio e dos serviços considerados essenciais; dentre outras. Esse conjunto de ações foram tomadas em algumas localidades, em outras realizadas tardiamente ou nem sequer foram coordenadas para serem executadas na maioria das cidades brasileiras. 

Outro ponto que poderia contribuir nessa crise, seria a incorporação de médicos de outras nacionalidades ao sistema público de saúde, com destaque para os médicos cubanos que durante anos atenderam em diversos postos de saúde e hospitais brasileiros, notadamente nas localidades mais distantes, dado que os médicos brasileiros formados em “grandes cidades” não tinham/tem interesse e se recusavam a trabalhar nas pequenas cidades ou comunidades distantes dos serviços disponíveis nas regiões metropolitanas.

A situação agrava-se com a postura e pronunciamentos negacionistas do presidente, diante dos apontamentos dos cientistas e especialistas da saúde a respeito da gravidade da pandemia, conforme mencionado anteriormente; seu apoio as manifestações com   aglomerações de pessoas sem os devidos cuidados de proteção e distanciamento; e os embates com dois ministros de saúde, provocando suas demissões porque não tinham suas indicações técnicas apoiadas pelo presidente. 

Vale lembrar a incoerência entre a prática atual do presidente e seus discursos de campanhas quando era candidato, de que colocaria técnicos e especialistas nos cargos públicos que demandam competências específicas, especialmente, os ministros, e lhes concederia carta branca para atuarem tecnicamente na resolução dos problemas.

A falta de consciência e de responsabilidade coletiva daqueles que não usam máscaras ou não cumprem a quarentena é reforçada com os twitter, memes, discursos e falas do presidente do Brasil. Para se ter ideia do nível de desprezo a respeito da gravidade da pandemia, no dia 24 de março de 2020, em pronunciamento no rádio e na TV, o presidente afirmou que a Covid-19 era um resfriado e, pelo seu histórico de atleta, ele não correria risco grave; inclusive, recomendou que as autoridades mantivessem o comércio aberto, o livre uso de transporte público e não fizessem o confinamento da população. 

Nesse momento de pandemia e de crises econômicas, o Estado deve estar presente e forte no sentido de ter capacidade de coordenar ações para reduzir impactos a população e prover o bem estar social. A recuperação da economia, que via de regra, deve ocorrer com a atuação do Estado, como a concessão de empréstimos, investimentos em infraestruturas que atendam a todos os sistemas produtivos, propiciando efeitos multiplicadores positivos na geração de emprego e pagamento de impostos mas, sobretudo, aqueles destinados as melhorias na qualidade da vida da população, como acesso à água e saneamento básico, saúde, energia, educação, habitação e alimentação. 

Por fim, reforçamos a importância de uma liderança capaz de construir o consenso e a urgência de estabelecer coordenação mínima entre os níveis de poder frente aos desafios impostos da pandemia, pois caso isso não aconteça, a volta do convívio social, do funcionamento dos sistemas produtivos, dos comércios, das instituições de ensino, dentre outros espaços serão incertos e levarão a incessantes ondas de contaminação e mortes provocadas pelas pessoas contaminadas com o SARS-COV-2.

segunda-feira, 25 de maio de 2020

Exposição: Sem Título, de Giovanne Reis

Apresentação
Um Sísifo invertido buscando o vazio*

A condição humana, segundo Albert Camus, é absurda. Isso se dá porque o homem, ser racional, que aprende, apreende e torna tudo conhecido por meio da razão, busca realizar esse processo com o mundo, que é, em última instância, irracional e inapreensível. O absurdo, portanto, é a razão que encontra seus limites. 

Em função disso, Camus apontará que a ação autêntica é manter o absurdo vivo por meio de sua negação, isto é, continuar o processo mesmo sabendo-o, no fim das contas, impossível. Nesse sentido, o homem teria de tentar ser feliz num processo como o do mito de Sísifo, condenado a levar uma pedra para o cume de uma montanha, para, logo em seguida, ela voltar à sua posição inicial e tudo recomeçar.

Isso é o que Giovanne Reis faz em seus desenhos, de modo similar e, não contraditoriamente, ao mesmo tempo, inverso. Ao contrário do Sísifo de Camus, Giovanne não busca expressar o racional, o conhecido, o familiar, o velho, mas o irracional, o estrangeiro, o estranho, o novo, aquilo que está escondido na alma humana, que não pode ser expresso pela razão. Por isso, muitos dos desenhos desse artista parecem ser feitos de uma só canetada, com o instrumento pesado, quase rasgando o papel, como se a força do afeto pudesse fazer o desenho, antes que ele pudesse ser captado por qualquer amarra racional. Quem já pôde tocar um nota isso logo de cara. Daí a similaridade de muitos de seus desenhos com desenhos infantis, que sempre são formas que as crianças encontram de expressar aquilo que elas ainda não sabem comunicar por meio de palavras.

É por essa razão, inclusive, que Giovanne abandona toda a linguagem verbal. Os desenhos desse artista sequer chegam a ganhar títulos. Afinal, a linguagem lógico-discursiva é sempre uma forma de falar sobre o mundo e ordenar a contingência. Quem já leu A náusea viu que Roquentin termina solucionando seu problema projetando escrever um romance, e não pintar quadros. A linguagem visual, por outro lado, consiste apenas em mostrar, dar a ver, revelar. Portanto, é mais propícia para trazer à tona o desconhecido.

Mas a linguagem visual de um desenho, apesar de menos rígida que a verbal, também tem códigos, também é apreensível de certa maneira pelo racional. Para tentar escapar a isso, o artista escolhe montar figuras por meio de linhas confusas e rabiscos. Isso faz com que, muitas vezes, formas conhecidas percam o sentido que usualmente têm. Rabiscos que em outras situações delineariam um sorriso, por exemplo, acabam expressando qualquer coisa, inclusive o oposto de um sorriso, diante da deformação do que há ao redor. E, no fim das contas, como acontece com os conceitos guarda-chuva, aquilo que expressa tudo, na verdade, termina por expressar nada, por revelar o vazio.

Mas Giovanne consegue êxito em sua vontade de ultrapassar o conhecido? Não. E isso parece ocorrer em função de um elemento trágico da nossa pós-modernidade: o fim da possibilidade de novas formas. Aí é que, apesar de todo o esforço, o artista acaba recorrendo a pastiches. A forma que ele usa nas obras termina como um pastiche de Basquiat. Pastiche esse que se revela ainda na representação de retratos e autorretratos de outros artistas conhecidos, como van Gogh, Picasso e Chet Baker. Artistas que são retomados não por referência ou reverência, mas por representarem postura similar a que Giovanne adota. Nesse ponto é que, apesar de tudo, a pedra volta ao estágio inicial.

E isso não é de nenhum modo um problema, pois o artista não se importa. Isso se revela tanto onde faz muitas de suas obras, num bloquinho de papel aleatório com pauta, quanto em sua indiferença com relação ao fato de seus desenhos levarem sua assinatura ou não. Para ele, importante é o processo de rolar a pedra, ainda que ele torne a acontecer indefinidamente.

Como um Sísifo invertido, rolando a pedra montanha abaixo, para, ao fim, ela surgir novamente no topo, Giovanne nos lembra uma coisa pontuada por Camus: tal atitude diante do absurdo é sempre uma atitude de revolta contra a condição presente. Nos tempos atuais, em que o mundo conhecido se esfacela, mas insiste em retornar mesmo sem se sustentar, a obra desse artista surge como um elemento para pensarmos sobre nossa vontade de revolta, de recusa do conhecido e de encararmos, portanto, o que é autêntico, ainda que de forma trágica.

 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis
 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis


 sem título, de Giovanne Reis
 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis


 sem título, de Giovanne Reis


 sem título, de Giovanne Reis


 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis



 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis

 sem título, de Giovanne Reis


 sem título, de Giovanne Reis
 sem título, de Giovanne Reis





*Texto de Matheus Cascaes