O deserto dos Weintraubs
Por Mauricio Braga
Na última sexta-feira (22/05/2020) foi divulgado um vídeo da reunião ministerial realizada por Jair Bolsonaro no dia 05 de abril. Com discursos afetados, meramente eleitoreiros, o seu conteúdo chega às raias do delírio – ou seja, longe, muito longe, do real.
Uma das participações mais vexaminosas da reunião foi a do ministro da educação, Abraham Weintraub. Este fez uma fala que, embora seja um compilado de bobagens, não podemos ignorar, pois escancara o perfil da direita brasileira. Sendo assim, comentaremos a seguir alguns elementos presentes no discurso do ministro.
A “liberdade”
Weintraub suscita em sua fala a “liberdade” – palavra essa que a burguesia tenta se apropriar. Mas sabemos que no capitalismo os trabalhadores só têm a “liberdade” de escolher entre se submeterem à exploração ou morrerem de fome. No contexto da pandemia, essa questão recebe ainda uma variação: os trabalhadores agora têm a “liberdade” de escolher entre se exporem ao covid-19 ou morrerem de fome. Tal dilema, entretanto, é uma falácia, posto que o Estado possui recursos para evitar as duas coisas. Contudo, entre provocar mortes ou distribuir renda, o Poder sempre escolherá a primeira opção. A acumulação no capitalismo está acima da vida.
Quanto à liberdade, ela só se efetiva quando todos os indivíduos possuem os meios de proverem sua existência material, sem que ninguém precise se submeter a outrem. Portanto, a liberdade é impossível no capitalismo. Mas, para dominar ideologicamente, a burguesia procura embaralhar os conceitos. Ela prega, como a elite em 1984 de George Orwell, que “Guerra é paz, Liberdade é escravidão, ignorância é força”, fazendo com que tenhamos o árduo trabalho de provar que 2 + 2 é igual a 4.
O “povo”
Ainda sobre o vídeo, após a tentativa de ser o paladino da “liberdade”, Weintraub ridiculamente se arvora o porta-voz do “povo”. Logo fica claro o tipo de “povo” ao qual Weintraub se refere. Povo, para o ministro, não engloba a integralidade dos brasileiros e brasileiras com sua diversidade. Antes, para ele, povo se refere a uma massa homogênea. Além de refletir o caráter racista da nossa elite, forjada no escravagismo, essa tentativa de padronização das massas visa excluir todos aqueles que não se encaixam no modelo ideal de cidadão consumista (em nossa sociedade, cidadania está atrelada a consumo). Daí decorre o ataque de Weintraub aos povos indígenas e ciganos. Todavia, o próprio real se encarrega de refutar o discurso do “todos somos um”. Na pasta de Weintraub, por exemplo, é onde mais se ver a disparidade entre os grupos sociais. Basta observarmos que, durante a pandemia, enquanto as camadas ricas dos centros urbanos têm acesso à educação (mesmo que virtual), os que habitam as periferias encontram-se desassistidos. Weintraub então aproveita o discurso da uniformidade para esconder a sua incapacidade de apresentar políticas públicas específicas que contemplem o caráter plural dos estudantes brasileiros.
O vazio
Ademais, ignoremos os impropérios contra o STF e a classe política. A suprema corte golpista, por sinal, só está sofrendo o ataque das serpentes que ela mesmo criou. Para a população que é assassinada nas favelas, dizimada nas tribos, ou abandonada nos hospitais, as querelas institucionais são secundárias. Infelizmente, é a essas querelas que a maior parte da esquerda reage de imediato, correndo em defesa dos “excelentíssimos” ao passo que ignora os que de fato foram ofendidos: os pobres do país.
Em relação a Weintraub, é provável que ele caia nos próximos dias. Veremos então ele ser substituído por alguém com os mesmos ideais. Por isso, o importante mesmo é desarmarmos as armadilhas discursivas da campanha bolsonarista; impedindo assim que o séquito de Bolsonaro use o vídeo supracitado como munição para fortalecer sua narrativa entre os incautos – ainda que, na verdade, esse vídeo revele apenas que, por trás das bravatas, só há um vácuo político.
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