A cidade desaparecida
por Victor Leandro
Falemos de Manaus como falamos do estado, do país, do continente, porém que nos toca já que aqui estamos, e é desse lugar então que percebemos o mundo, que este se nos torna significativo e presente, ficando por esse motivo nossa perturbação como a mesma que paira sobre aqueles que em todo o orbe sentem e se angustiam, que conseguem persistir e rumar contra a correnteza dos fatos obtusos.
É essa experiência que nos diz: a cidade não existe. Não que tivesse um dia existido. Contudo, não faz muito tempo, podíamos capturar o seu prenúncio de manifestação. Hoje, até os fantasmas desviam nosso caminho, e o que temos é tão só uma melodia dolorosa e triste, que toca ao fundo, ratificando o peso de nossa miséria. Uma repleta geografia da ausência.
Passando pelos lugares anoitecidos, não ouvimos novidades, e sim notícias. Acrimoniosas informações de sujeitos mutilados e vidas partidas, proliferando-se com intensidade semelhante à da chuva. Os hospitais tornaram-se casas de agonia. Nos bares, nenhuma música, nenhuma canção a romper com a morte e seus signos. Os artistas partiram. Restam os alto-falantes renitentes das igrejas, que convertem pecados em mesquinhos benefícios.
Sim, a cidade se foi e deixou como rastro suas vias obscuras. Nelas, somente corpos inanimados trafegam como mortos-vivos. Mas há ainda que se pensar em dias triunfantes, onde a aurora avermelhada despontará nas esquinas. Até que surja esse momento, tudo que nos cabe é suportar e investir contra o vazio adiante.
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