quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

Unir sem unificar, por Mauricio Braga



Unir sem unificar
por Mauricio Braga

Quando o próprio presidente da república endossa a convocação de um protesto contra as instituições, fica claro que o Estado Democrático de Direito* corre perigo. O que fazer então? Naturalmente é preciso unir as frentes democráticas, a despeito de suas posições ideológicas, para salvaguardar a constituição e destituir o presidente.  

Tal união, entretanto, deve ser feita com cautela. Ela deve ser apenas em pautas pontuais, como a que ora se apresenta; pois a união configura-se como um momento de trégua em que as partes envolvidas cessam o combate entre si, visando atingirem, cada uma em sua trincheira, um alvo em comum. Não é, portanto, uma mistura de diretrizes, uma vez que cada parte continuará com seu projeto de país distinto daquele com quem se une. Em outras palavras, não é uma simbiose orgânica e perene. Já a unificação na política, pelo contrário, é quando partes diferentes fazem concessões para se tornarem um todo homogeneizado. A distinção desses termos parece não ser compreendida por um setor da esquerda, cuja representação é o governador Flávio Dino (PCdoB), que confunde união com unificação.

Flávio Dino acena para todos os lados. Sua mão é ambidestra, convida alianças tanto da esquerda quanto da direita. Entre os seus seguidores, já há quem defenda uma chapa do maranhense com Luciano Huck, ligado aos tucanos entreguistas, responsáveis – em parte – pela desindustrialização do país. Ou ainda uma chapa com Rodrigo Maia, que conduziu e defendeu no congresso nacional o que Vladimir Safatle chamou de a maior derrota da história da classe trabalhadora brasileira: a reforma da previdência (como não lembrar do choro de Maia comemorando a aprovação da reforma?!). É com pessoas desse perfil, inimigos da classe trabalhadora, que um dito comunista deve se aliançar? A pergunta é retórica. 

Dessa forma, conscientemente ou não, a turma de Dino faz coro ao discurso de que é preciso fazer concessões ao neoliberalismo. Se tais concessões forem efetivadas, em breve o mapa político será redesenhado: a extrema-direita será direita; a atual direita virará centro; e o centro será esquerda. Resultando na aniquilação desta última. 

Temos, portanto, que ter coragem para construir a nossa agenda para o Brasil. Uma agenda legitimamente de esquerda, que seja uma alternativa ao neoliberalismo, e não a parte branda dele. A esquerda não pode se contentar em ser um mero lubrificante para amenizar a implementação de medidas neoliberais. Neste momento de recrudescimento da luta de classes, precisamos fortalecer o nosso polo, não o diluindo em conchavos.




* Estado Democrático de Direito é um termo um tanto problemático, visto que a democracia liberal em que vivemos é uma farsa, que mascara a ditadura de classe. Esse termo foi empregado, no texto, em senso comum, pois fugiríamos do tema caso o deslindássemos. Não obstante, também é problemática a defesa das instituições. Afinal, na perspectiva marxista, as nossas instituições são instrumentos de dominação burguesa. Todavia precisamos ler a conjuntura. No Brasil, as instituições estão sendo ameaçadas por grupos de extrema-direita, e não pelo proletariado. Sendo assim, não podemos coadunar com os objetivos escusos desses grupos, que antagonizam com os interesses do povo. Ora, é óbvio que tais grupos não querem romper com o sistema capitalista, mas sim realçar o seu caráter predatório, repressivo e genocida. Neste momento, as instituições representam um freio contra os arroubos autoritários. Um freio frouxo, sim, mas um dos poucos que ainda dispomos. Caso o Bolsofascismo consiga minar essas instituições, a classe trabalhadora encontrará mais dificuldades de organização e perderá o restante dos seus direitos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário