quarta-feira, 26 de fevereiro de 2020

O carnaval e suas cinzas, por Victor Leandro

Coluna Segunda Via



O carnaval e suas cinzas
por Victor Leandro

Em sua constituição básica e histórica no país, o carnaval sempre foi revolucionário e transgressor. Uma festa envidada por trabalhadores e que manifesta as suas mais exuberantes realizações estéticas e corpóreas, condensadas nos quatro dias de festa. Uma perfeita realização sensualista das potências do maravilhoso. Dionísio bruto.

Assim, não impressiona que, em nosso recente cenário de trevas, ele encampe para si a tarefa de uma crítica política mordaz, ferina e sistemática contra o presente desgoverno, o qual, acuado, não pode fazer mais do que proferir seus costumeiros impropérios, ora inaudíveis por conta do grito frenético das ruas.

Claro, existe o carnaval, e existe o comércio, assim como a simples imitação carnavalesca. Em alguns lugares, essa politização não aparece, e o que resta é a reunião alienante e a ubiquidade fascista. Uma degradação que não cria nada, apenas limita-se a reproduzir os ditames da indústria, sendo isso tudo permeado pela estupidez machista e alcoólica dos homens ridículos. Curiosamente, há ainda quem chame esses eventos de bloquinhos, com fins de dar um ar nostálgico ao que ali ocorre, porém que está muito longe de corresponder a esses desígnios. Normalmente, o mecanismo de identificação desses lugares é indefectível. Onde há música ruim, a estultice se faz presente.

Sim, todas essas essas coisas ocorrem e podem ser pensadas. Mas, e depois da quarta-feira de cinzas?

Eis aí o ponto em que temos de nos debruçar. Ou bem o carnaval torna-se o estopim de uma mudança, ou permanecerá na mera esfera do espetáculo. Não podemos querer ser libertários apenas durante a festa da carne. É preciso seguir lutando, em especial quando despimos nossa fantasia. E que caia deposto Pantaleão. E que sorriam o Pierrot e a Colombina.

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