sexta-feira, 9 de agosto de 2019

ASPECTOS FRAGMENTÁRIOS E LACUNARES NA OBRA SATÍRICON, DE PETRÔNIO, E NO FILME FELLINI SATYRICON, DE FEDERICO FELLINI

Literatura e Cinema

ASPECTOS FRAGMENTÁRIOS E LACUNARES NA OBRA SATÍRICON, DE PETRÔNIO, E NO FILME FELLINI SATYRICON, DE FEDERICO FELLINI*

Por Luana Aguiar Moreira

INTRODUÇÃO
Em Roma, a prosa literária inicia-se a partir de uma preocupação estética no trato com a linguagem. Ela desenvolve-se, principalmente, a partir do contato com a cultura helenística, devido ao rigor poético mais elevado desta. Segundo Cardoso (2011, p. 04-05), a partir deste contato, “nasce a verdadeira literatura latina. [...]. Tenta-se, pois, atingir o nível dos modelos que vêm de fora, e, se possível, superá-los. A luta foi árdua, mas em muitos casos, a literatura latina conseguiu ser criativa e original”. Satíricon (século I d.C.), de Petrônio, insere-se nesse período e é considerado o primeiro romance em língua latina (CARDOSO, 2011, p. 126), embora, hoje, tenhamos apenas algumas partes dos livros XIV, XV e XVI da obra. As informações a respeito da vida de Petrônio são escassas e incertas. Segundo Cardoso (2011), os estudos tradicionais afirmam que o autor pode ter sido Caius ou Titus Petronius (Caio ou Tito Petrônio), com apenas a data de falecimento definida: 56 d.C. Neto (2016), na apresentação da edição de Satíricon utilizada neste estudo, refere-se ao autor como Petrônio Árbitro. Ambos os estudiosos afirmam que ele teria vivido no tempo de Nero, imperador romano, ou até mesmo trabalhado em sua corte, entre os anos 54 e 68 d.C. Neste artigo, daqui em diante, nos referiremos ao autor apenas como Petrônio, a título de padronização.
À fragmentação da obra de Petrônio é possível atribuir, no mínimo, dois motivos: o primeiro é a própria perda, devida ao tempo, de partes da narrativa; o segundo ocorre em função do seu caráter oral, principal característica da origem da poesia latina. De acordo com Cardoso (2011, p. 03), “entre as velhas culturas mediterrâneas, de origem indo-europeia, as mais antigas manifestações de poesia se associam invariavelmente à música”, que tinham como base o verso – sobretudo o satúrnio, na Itália central. Os cânticos latinos, embora não sejam considerados como formas literárias consolidadas, foram os primórdios da literatura latina, “embriões literários anunciando, já, os futuros gêneros: o épico, o dramático, o lírico, o satírico e o didático” (CARDOSO, 2011, p. 04). A história da literatura latina nos evidencia que era mais comum as histórias serem escutadas, apreciadas oralmente, do que lidas, e só posteriormente serem registradas pela escrita – como no caso das epopeias de Homero, por exemplo. Tal fato pode ter tornado, de certa forma, desnecessário desenvolver uma narrativa tão conexa a respeito da história de Satíricon, afinal, todos os leitores (isto é, ouvintes) supostamente já conheciam os caminhos da narrativa.
Porém, a despeito de sua incompletude, Satíricon ainda é obra literária tanto de deleite, quanto de estudos e influências para a nossa sociedade, mesmo após, pelo menos, dois milênios de sua escrita. Em 1969, o cineasta italiano Federico Fellini (1920-1993) dirigiu seu décimo terceiro filme, Fellini Satyricon, uma adaptação do romance de Petrônio. Este artigo pretende comparar, identificar e analisar elementos da adaptação cinematográfica de Satíricon, dando enfoque aos aspectos fragmentários e lacunares de ambas as obras e de que formas elas se articulam entre si, tendo em vista que o filme não é somente uma adaptação subjugada à sua fonte “de origem”, isto é, o romance, mas sim uma recriação realizada por um tradutor (cineasta) que estabelece um diálogo com a obra literária.

APONTAMENTOS PRELIMINARES: DA LITERATURA AO CINEMA
No campo de estudos de Literatura Comparada é possível realizar pesquisas que vão além da análise entre literatura propriamente dita, mas também investigar a relação de obras literárias com outros meios artísticos, como a pintura, a música, o cinema etc. Segundo Tânia Carvalhal, em Literatura comparada (2006, p. 74), “esses trabalhos expressam a tendência comum de ultrapassar fronteiras, sejam elas nacionais, artísticas ou intelectuais, mas igualmente de explorar o imbricamento da literatura com outras formas de expressão artística e outras formas de conhecimento”. Isto é, “os estudos interdisciplinares em literatura comparada instigam a uma ampliação dos campos de pesquisa e aquisição de competências” (p. 74). Como será observado neste artigo, a relação entre a literatura e o cinema, como Carvalhal afirma, é uma forma de ultrapassar fronteiras, expandir horizontes entre as artes, e identificar pontos de semelhanças nas diversas manifestações artísticas.
No que diz respeito à adaptação cinematográfica, neste artigo, consideramos, como base para compreensão, A literatura através do cinema: realismo, magia e a arte da adaptação (2008), de Robert Stam, e o artigo de Ismail Xavier intitulado “Do texto ao filme: a trama, a cena e a construção do olhar no cinema” (2003). Ambos os autores partem da mesma perspectiva de análise quanto à ideia de dialogismo e interação entre campos semióticos distintos – neste caso, a literatura e o cinema.
Segundo Stam (2008), a passagem ou adaptação de uma linguagem para outra implica, instantaneamente, em modificações. Entende-se que literatura e cinema trabalham com dois tipos de linguagem distintos: a primeira, dando maior valor à linguagem verbal; já a segunda, à linguagem não-verbal. Em outras palavras, a literatura trabalha com a palavra e o cinema com as imagens, sons, entre outros mecanismos. Assim, segundo o autor, a ideia de fidelidade ao romance – tão discutida pela crítica tradicional – não deve ser levada em consideração, tampouco ser o ponto de partida para análise, pois ambos os textos possuem uma interação dialógica. O que, de fato, merece destaque são as diversas interpretações geradas a partir destas, visto que
 a passagem de um meio unicamente verbal como o romance para um meio multifacetado como o filme, que pode jogar não somente com palavras (escritas e faladas), mas ainda com música, efeitos sonoros e imagens fotográficas animadas, explica a pouca probabilidade de uma Fidelidade literal, que eu sugeriria qualificar até mesmo de indesejável (STAM, 2008, p. 20).
Xavier (2003, p. 62) corrobora essa ideia quando afirma que “livro e filme estão distanciados no tempo; escritor e cineasta não têm exatamente a mesma sensibilidade e perspectiva”. O eixo comum entre a literatura e o cinema, segundo o autor, é a narrativa: “o filme narrativo-dramático, a peça de teatro, o conto e o romance têm em comum uma questão de forma que diz respeito ao modo de disposição dos acontecimentos e ações das personagens” (XAVIER, 2003, p. 64). Todos têm como princípio a narração, isto é, contar uma fábula. O que muda é a maneira como cada escritor ou diretor de cinema desenvolverá a forma de contá-la – o que se constitui a trama. Nas palavras do autor:
Um filme pode exatamente estar mais atento à fábula extraída de um romance, tratando de tramá-la de outra forma, mudando, portanto, o sentido, a interpretação das experiências focalizadas. Ou pode, no outro pólo, querer reproduzir com fidelidade a trama do livro, a maneira como estão lá ordenadas as informações e dispostas as cenas sem mudar a ordem dos elementos (XAVIER, 2003, p. 67).
Tomemos de início o enredo do romance de Petrônio: no livro, narra-se as histórias do jovem estudante romano Encólpio (que é protagonista e narrador), Ascilto, seu amigo, e Gitão, o “irmãozinho” e amante disputado pelos dois colegas. A história inicia-se em uma escola de retórica, onde Encólpio ouve o discurso de seu professor Agamênon. Depois, Encólpio narra as diversas peripécias dos jovens ao longo do banquete de Trimalquião, um novo-rico romano, até a fuga de Encólpio, Gitão e Eumolpo (um velho poeta incompreendido) à cidade de Crotona, após o terrível naufrágio do barco de Licas e Trifena. Como já observado, o romance permanece fragmentado (ao todo, são 141 pequenos capítulos), deixando uma série de lacunas ao longo da narrativa. Tal elemento foi fundamental para a sua recriação no cinema através do olhar de Fellini, pois deu-lhe abertura ora para introduzir narrativas transversais, ora para compor uma obra fragmentada e desconexa.
Neste sentido, Federico Felllini, ao traduzir o romance de Petrônio, o transpõe para outro universo, além das letras: o da expressão. Isto é, a imagem e a expressão vão sobrepor-se ao diálogo entre as personagens – o que é bastante comum no romance. Em Fellini por Fellini (1983, p. 93), o próprio diretor afirma o lugar do diálogo na sua obra: “A função do diálogo é unicamente de informação. Penso que no cinema, vale mais a pena utilizar outros elementos, como iluminação, objetos, o cenário no qual se desenrola a ação, que têm muito mais expressão que páginas e páginas de diálogo”. Assim, se por um lado os diálogos não são frequentes (e, quando ocorrem, são muitas vezes transformados em solilóquios que, por sua vez, são mais expressivos, visto que é uma categoria do gênero dramático), por outro temos um excesso de imagens, cores, jogos de iluminação, expressões, cortes de imagens, efeitos sonoros, entre outros elementos do cinema que compõem o universo e a “marca” do autor. Mais significativo ainda é compreender os diversos olhares sobre Roma, que Fellini tanto busca apresentar em suas obras: La Dolce Vita (1960), Roma (1973), Amarcord (1973), Giulietta degli spiriti (1965), entre tantos outros filmes que abordam a capital italiana de modo imaginário e simbólico, à luz das interpretações do cineasta. A Figura 1 a seguir, ilustrando um momento do banquete de Trimalquião, exemplifica essa verificação:

Figura 1 - Banquete de Trimalquião
Fonte: Fellini, 1969.

Os personagens vez ou outra direcionam seus olhares para a câmera sem, no entanto, olharem diretamente para ela. As cores do vestuário, do espaço e de suas maquiagens são extravagantes. Além disso, é realizado um jogo de iluminação e sombras (como na imagem acima, entre Fortunata e os jovens “serventes”) e de música, ruídos e sons distorcidos. Tudo isso pode ser associado a certo ambiente surrealista e mágico, compondo o ideal de recriação proposto pelo diretor – a sua própria Roma. Nota-se, dessa forma, a visão adotada para recriar Satíricon, baseada em elementos expressivos, em contraste, por sua vez, com a obra “original”, estruturalmente escrita e baseada em descrições, diálogos e narrações. Abre-se, assim, um campo de interpretações possíveis.

LACUNAS, FRAGMENTOS E RECRIAÇÃO
Em sua totalidade, Fellini Satyricon pode ser dividido em nove sequências narrativas que não apresentam, necessariamente, uma conexão entre si. Várias são as cenas em que ocorrem cortes abruptos, assim como na narrativa de Petrônio. Por exemplo, quando Gitão decide permanecer com Ascilto em vez de Encólpio, este pensa em se matar. Essa interpretação, no entanto, é subjetiva, uma vez que não fica clara, no filme, a intenção da personagem de se matar. Encólpio, encolerizado e sem saber o que fazer diante de tamanho desgosto, apenas olha para o gládio sobre a mesa, momentos antes do terremoto. Apesar disso, é possível subentender como um pensamento de suicídio, uma vez que é frequente, no romance, a tentativa tanto de Encólpio quanto de Gitão de tirarem a própria vida (mesmo que todas tenham sido fracassadas). Um exemplo é quando Encólpio tenta enforcar-se: “Encerrado, decidi dar cabo da vida por enforcamento” (PETRÔNIO, 2016, p. 139); porém, no mesmo instante, Gitão entra no quarto, o livra da morte e, em seguida, procura o mesmo objetivo: “Você muito se engana, Encólpio, se acha que vai morrer antes de mim [...] E para que saiba que a morte não está longe dos que a procuram, assista você mesmo ao espetáculo que quis me obrigar a ver” (PETRÔNIO, 2016, p. 139).
No entanto, um terremoto irrompe e é gerada grande destruição das instalações. Abruptamente, o filme é “cortado” para quando Encólpio, ao admirar peças de arte em uma galeria, encontra o velho poeta Eumolpo. A sequência não é mantida e o espectador não tem mais acesso tanto ao desenvolvimento da narrativa anterior quanto ao seu próprio espaço de realização.
De forma semelhante, tal fenômeno ocorre em outros momentos do romance. Após ter sobrevivido ao naufrágio do navio de Licas Tarentino e Trifena e estabelecer-se na cidade de Crotona com Gitão e Eumolpo, Encólpio passa a ter problemas de impotência. Embora a situação seja tragicômica, ao conversar com Gitão, o jovem sente repulsa de si e confessa a seu “irmãozinho”: “Está morta aquela parte do meu corpo que fazia de mim um Aquiles” (PETRÔNIO, 2016, p. 199). Diante do fracasso de seu desempenho sexual, escreve a Circe – a mulher que não conseguiu possuir – envergonhado e pedindo perdão: “Cometi uma traição, assassinei um homem, violei um templo: em função desses crimes, seja determinado o castigo. Se a morte lhe apraz, apresento-me com a espada; se o açoite lhe parecer suficiente, corro até aí já nu” (PETRÔNIO, 2016, p. 200, grifo nosso). O leitor, no entanto, desconhece que assassinato e violação de templo a personagem se refere, ficando a cargo do cinema, já no século XX, de desevolver este espaço e dar voz a novas interpretações e narrativas, através do olhar de um diretor de cinema.
Assim, em Fellini Satyricon, é inserida uma nova narrativa, uma espécie de “preenchimento” dessa lacuna: o sequestro do semideus, no qual ocorrem, de fato, dois assassinatos. Encólpio e Ascilto, juntamente de um homem (personagem sem nome, que estava presente no local), sequestram um semideus hermafrodita, que dormia em seu leito. Entretanto, no meio do caminho, o semideus falece, devido à exposiçao ao sol e falta de água. O homem que os acompanha enfurece-se e tenta matar Ascilto, acusando-o de ter assassinado a divindade. Encólpio, então, ataca o homem, para proteger o amigo. Os dois abandonam os dois corpos e retomam seus caminhos.
Um último elemento a ser analisado é a cena final. Em sua maioria, os filmes de Fellini não apresentam desfechos; suas cenas finais são abertas, não apresentando uma resolução para a narrativa desenvolvida. Esse mecanismo deixa sua “obra aberta” – ideia proposta por Eco (1991) – a quem assiste, sob um efeito de estupor e, ao mesmo tempo, inquietação, embora o próprio cineasta não ambicione filmes ou cenas finais grandiosas. As cenas finais de Otto e Mezzo (1963), um “espetáculo” de circo executado por todos os personagens do filme, como uma grande paródia da própria exibição deste, e La Dolce Vita (1961), no qual, numa praia, um grupo de jovens encontra uma arraia à beira da morte e, em seguida, ocorre a conversa incompreendida – devido ao barulho das ondas – entre o Marcello Rubini e uma jovem do outro lado da praia, são alguns exemplos de cenas abertas e representativas do cinema de Fellini.
Também em Fellini Satyricon esse método não seria diferente. Na cena final, Encólpio, após embarcar no navio acompanhado pelos escravos do falecido Eumolpo, segue em direção à África. A única imagem que vemos é do alto-mar e é narrada por ele:
– Largamos âncora nessa mesma noite, com vento pela popa. Deixamos Eumolpo. Eu fazia parte da tripulação. A âncora retiniu nos leitos de enseadas de portos desconhecidos. Pela primeira vez, nomes como Kelicia, Rectis... E numa ilha coberta com erva de odor doce, um jovem grego contou-me que anos...
A sua fala, no entanto, é cortada repentinamente. A imagem de seu rosto aparece por apenas alguns segundos, assinalando um sorriso dissimulado, mas logo é transformada, aos poucos, em uma pintura. Ao recuar-se lentamente, o quadro expande-se e vamos reconhecendo os outros personagens – Gitão, Vernacchio (embora este não seja um personagem do romance, pois foi criado por Fellini, é um ator romano bastante conhecido, que comprou Gitão de Ascilto no início do longa), Ascilto, Eumolpo, Trimalquião, Fortunata, Enótea –, todos juntos, pintados nas paredes de ruínas à margem do mar Mediterrâneo. A partir da cena final de Fellini Satyricon, temos a impressão de sairmos do filme, do “mundo” da narrativa, e passamos a perceber-nos enquanto espectadores/leitores: existe um tempo-espaço da história de Satíricon e outro tempo-espaço de nosso universo, como mostra a Figura 2 a seguir:

Figura 2 - Cena final
Fonte: Fellini, 1969.

Indo mais além, podemos compreendê-la, inclusive, como uma representação da quebra de ilusão cinematográfica, do “sonho” do cinema, pois tomamos a noção de que os personagens são apenas personagens que estamos assistindo. A esse respeito, Fellini expõe o que essa plena consciência de si mesmos representa:
Em meus filmes não sugiro soluções, métodos, não proponho ideologias, limito-me a ser testemunha do que me acontece, e interpretar e expressar a realidade que me rodeia. Se através de meus filmes, quer dizer, reconhecendo-se neles, os espectadores alcançam uma plena consciência de si mesmo, supõe-se ter realizado esta condição de lúcida separação de si mesmos que é essencial para poder continuar fazendo escolhas, realizar modificações e transformações (FELLINI, 1983, p. 130).
Destarte, os personagens desenhados nos muros já o são tanto os de Petrônio quanto os de Fellini, pois fundem-se como único fio narrativo, e os destroços podem ser interpretados como uma alegoria para a passagem do tempo, a fragmentação da narrativa ou uma destruição iminente daquele povo, que existiu em um tempo longínquo e mágico – mas que se acabou. Ambos os elementos se unem e passam a compor um ideal apenas: uma narrativa distante e fragmentada, mas que, ao mesmo tempo, está presente em nosso imaginário e é recontada, ou recriada, pelo cinema.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
As discussões a respeito da “transferência” de uma obra literária para o cinema, pela crítica especializada, parecem infinitas. A perspectiva mais tradicional considera, geralmente, a literatura como ponto de partida para a sua análise; como apenas um “roteiro” a ser seguido. No entanto, foi possível perceber, a partir do estudo realizado, o modo pelo qual o diálogo entre dois campos semióticos pode ser mais proveitoso, já que as manifestações artísticas (seja a literatura, o teatro, o cinema, a música etc.) e suas adaptações, ou até mesmo um hibridismo entre elas, gera maior riqueza interpretativa. Percebemos que ambas as obras abrem caminhos para novas interpretações artísticas, colocando em questão o formato da narrativa no cinema e na literatura. Mesmo essa sendo uma prática comum do cinema de Fellini, a fragmentação toma outra dimensão, quando utilizada a partir da obra de Petrônio, pois ele a utiliza como mecanismo de reinterpretação para a narrativa do romance que ficara fragmentado devido ao tempo ou, em segunda instância, devido à própria forma do romance naquele período histórico. Assim, ao comparar as obras Satíricon e Fellini Satyricon, criadas em períodos históricos, sociais e culturais completamente adversos, é possível verificar, ainda assim, suas dimensões que se cruzam a partir de uma releitura, a seu modo, sensível, simbólica e universal.

REFERÊNCIAS
CARDOSO, Zélia. A prosa literária. In: CARDOSO, Zélia. A literatura romana. 3. ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2011.

CARVALHAL, Tânia Franco. Literatura comparada. 4. ed. rev. e ampliada. São Paulo: Ática, 2006. (Série Princípios; 58).

ECO, Umberto. Obra aberta. 8. ed. São Paulo: Editora Perspectiva, 1991.

FELLINI, Federico. Fellini por Fellini. Tradução de José Antônio Pinheiro Machado, Paulo Hecker Filho e Zilá Bernd. Porto Alegre: L&PM, 1983.

FELLINI SATYRICON. Direção: Federico Fellini, Produção: Alberto Grimaldi. Itália: PEA, 1969.

NETO, João Angelo Oliva. Satíricon: sátira de quem? In: PETRÔNIO. Satíricon. Tradução de Alessandro Zir. 1. ed. Porto Alegre: L&PM, 2016.

PETRÔNIO. Satíricon. Tradução de Alessandro Zir. 1. ed. Porto Alegre: L&PM, 2016.

STAM, Robert. A literatura através do cinema: realismo, magia e arte da adaptação. Tradução de Marie-Anne Kremer e Gláucia Renate Gonçalves. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2008.

XAVIER, Ismail. Do texto ao filme: a trama, a cena e a construção do olhar no cinema. In: PELLEGRINI, Tânia et al. Literatura, cinema e televisão. São Paulo: Editora Senac São Paulo: Instituto Itaú Cultural, 2003.

*Publicado originalmente na revista A MARgem. Disponível em: http://periodicos.ileel.ufu.br/index.php/amargem/article/view/333

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