terça-feira, 27 de agosto de 2019

Conto de agosto, de Bruno Oliveira

Conto
Conto de agosto

Às seis horas da manhã, eu sempre tomo café com pão e presunto. Mas eu não sinto o gosto de café com pão e presunto. Eu não sinto gosto nenhum. Escovo os dentes, me arrumo para ir ao trabalho, saio e sempre pego o mesmo ônibus lotado, e quase sempre, por isso, vou em pé. Odeio ir em pé porque vejo o meu rosto no reflexo da janela. Não gosto do meu rosto. Não gosto desse ônibus e muito menos dessas pessoas que habitam esse bairro. Meus pés doem. E eu tenho câncer no cu. A única coisa que eu gosto dentro do ônibus é ficar lendo mensagem ou status de WhatsApp das pessoas. Um dia desses descobri que +92 99818328 queria sentar gostoso na rola do rapaz que estava na minha frente. Rapaz de sorte esse. Como eu gostaria de receber mensagens assim. Outra vez era alguém perguntando para outro alguém se já tinha pago a conta da C&A. É claro que não. Ninguém tem emprego aqui, muito menos dinheiro. Eu sou um sortudo por conseguir trabalhar no Shopping como segurança o dia todo. Mais sortudo ainda é por trabalhar de Uber aos fins de semana. Sou feliz por comer pizza sempre aos domingos. Sou mais feliz ainda por expulsar a mando das grã-finas que trabalham como professoras das universidades próximas ao shopping os molambentos que pedem dinheiro das professoras das universidades próximas ao shopping. Sabe de uma coisa, eu adoro justificar as minhas atitudes me fazendo de vítima mesmo eu estando errado. Mas a melhor coisa é não precisar justificar um erro quando todos erram. Ah, esqueci de falar, mas hoje tem jogo do flamengo e ninguém consegue falar sobre outro assunto. E, sim, eu acho que o megão vai ganhar a libertadores. Nós temos o Bruno Henrique.

Autor: Bruno Oliveira

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