domingo, 11 de agosto de 2019

O Domingo

Coluna Segunda Via

O DOMINGO
Por Victor Leandro

O domingo é a maior confissão de fracasso da sociedade burguesa. Enfastiada e esgotada de si, ela precisa gerar uma interrupção periódica no fluxo de seu movimento, a fim de recuperar o ânimo frente ao tédio lancinante de seu modo de vida. Sem condições de suportar-se, ela se esconde nas parcas horas de repouso num dia inútil.

Irritados e corroídos pelo desânimo, os corpos procuram um lugar à sombra da angústia dos dias tristes da semana. Alguns, mais intrépidos, arremessam-se em prazeres inócuos, os quais não devem ultrapassar o pôr do sol, uma vez que as agruras do dia seguinte corrompem o momento presente. Outros, menos otimistas, dedicam-se apenas a repousar. A estes, não há mais meios de escapar da prisão do Capital. Doutrinados e instruídos, eles nem mesmo se arriscam a desafiar a ordem de descanso que lhes foi conferida, e, contra qualquer ameaça de ação, resignam-se a responder que hoje é domingo, ou seja, que não são capazes de algo fazer.

Mesmo para aqueles que não estão inseridos na ordem do trabalho - no Brasil de hoje, são muitos - o domingo exerce seu domínio totalizante. Pairando como sombra ao redor de tudo que os cerca, ele os paralisa e os coloca numa inércia inamovível. Não podem andar, sair, conversar, existir, estar no mundo. Apenas a espera do dia seguinte e da autorização para viver. Robóticos escravos da mais-valia e alienação.

Enquanto houver domingo, a sociedade burguesa não irá desaparecer. Somente no dia em que as formas de atividade humana estiverem em tal potência criativa que não precisarão mais negar a si mesmas, é que poderemos nos considerar verdadeiramente libertos para vivenciar o tempo naquilo que possui de mais intenso e produtivo. Nesse momento, é quando nos tornaremos decisivamente emancipados, e o socialismo encontrará a síntese autêntica entre trabalho e o prazer poético das horas livres.

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