sábado, 21 de março de 2020

A fuga, de Victor Leandro

Conto

A fuga

-Não pense, não pense!

Não, não existe mais fato ou ideia. Somente os pés que escapam ligeiros. Ele é todo só o corpo em movimento. Um autômato a quem foi dada tão somente uma ordem: fugir. Nada mais lhe ocorre que não seja avançar sobre a linha à frente.

Agora, ele nem mesmo se lembra mais de quem o perseguia, nem por que motivo. Terá cometido um crime? Uma injúria, talvez? Não tem importância. O que vale é tão somente distanciar-se do perigo. Avante!

As pernas falham. Seus pés começam a tentar desistir. Olha pra trás e não vê ninguém. Mas os carrascos estão invisíveis desde o princípio. Eles próprios não sabem que existem. Apenas perseguem e matam. Tudo é um só instinto.

-Não reflita. Corra!

A cidade já é uma paisagem ao longe. Porém, isso não lhe dá nenhuma segurança. Pensando bem, é muito provável que ele esteja um passo atrasado, que o inimigo encontre-se tranquilo ali adiante, e se diverte com seu desespero. De repente, sentiu-se ridículo.

-É impossível.

Ou talvez não fosse. No entanto, agora é tarde demais para prosseguir. Deveria ter mudado tudo já no princípio. Que lhe resta então além de encarar o destino trágica e pacificamente? É melhor enfrentar a adversidade com grandeza.

Diminui o passo, interrompe-se, Recobra o fôlego. Observa o mundo mais uma vez. Sem barulho, os carrascos chegam. A verdade lhe transpassa como um imenso desígnio.

Victor Leandro

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