O baile
Ela saíra do palanque apressada e eufórica. Pela primeira vez, sentia que todas as palavras estavam no lugar certo. Havia acertado em cada detalhe, cada tom de voz, cada enervação. Os companheiros dividiam a mesma alegria. Não sobrara a menor dúvida. A revolução viria ao amanhecer.
Passou então a comentar os aplausos recebidos. Risos e sinais jocosos, alguns bonitos. Perguntou a que horas estavam. Sim, já tinha se atrasado para o baile. Precisamos confraternizar. Essa festa é mais do que merecida.
No salão, os amigos de costume. Os elogios. A beleza. O ego. muitos pretendentes a compartilhar uma dança. Outros estavam às voltas com fotografias. Tragam a bebida! essa noite se encerrará com um grande alvorecer. Fizemos nosso trabalho. O mais se dará por força própria.
De repente, uma ligação. Ignore, disse ela. Nossa parte está feita. Dancemos. Mas pode ser importante. De certo que é, mas há quem o resolva, sempre há. Mais vinho. Sim, somos eruditos, e por isso bebemos a bebida dos deuses. Cantemos juntos. Mais alto, mais alto! É preciso que o quarteirão inteiro nos ouça. Ah, como é prazerosa a vida!
Já pelas duas, não sabiam mais onde terminava um ou o outro. Tudo era um fluxo contínuo e absoluto, uma energia que transpassava cada corpo e desembocava na atmosfera líbida e sinérgica. Uma entrega sensorial completa e aguda, alimentada pelos eflúvios sinuosos de gestos rítmicos.
Passadas as emanações frenéticas, a manhã despontou. Porém, nessa hora, já não podiam mais. Exauridos, dedicavam-se apenas aos percursos das sendas oníricas do sono.
Atravessando a rua, um trabalhador corria com pressa. O ônibus passava pontualmente às cinco e meia.
Victor Leandro
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