O último escritor
Sil Granz caminhava rápido. Não queria desperdiçar sua euforia. Escrevera o romance que pensava ser escrito. As palavras, que durante muito tempo estiveram confusas e fugidias, encontravam-se finalmente todas no lugar. Nenhuma frase que pudesse renegar no futuro. Sem sombra de dúvida, era chegado o instante da plenitude de sua forma.
Curiosamente, Laclau, que desde o início apoiara sua empresa, permanecia quieto. Uma palavra sequer a respeito do escrito. Que as editoras silenciassem, compreendia. Não era a primeira vez. Mas com seu maior interlocutor, soava absolutamente estranho. Também com Maira, que escrevia poemas. E Rosa, que acumulava biografias extensas. Rigorosamente nada vindo deles. Um vazio absurdo, impossível.
Chegou à porta do edifício com passos decididos. Deixaria os papéis nas mãos do editor. Sim, dessa vez não restariam desculpas. Seria publicado e pronto. Girou a maçaneta, e surpreendeu-se que estivesse trancada. Olhou pelas janelas, e não viu mais do que folhetos velhos e móveis empoeirados. Mudaram-se? Para onde teriam ido? É muito azar que isso ocorra justo no seu momento.
Foi então à livraria mais próxima, perguntar se sabiam alguma coisa. Assustou-se novamente quando percebeu que ela estava também fechada. Fazia muitos anos que estava ali, funcionando a pleno vapor. Seguiu percorrendo então as outras que havia no centro, deparando de maneira invariável com a mesma imagem. Placas retiradas e grades descidas. Mesmo nos sebos, não se tinha o mínimo sinal de que houvessem existido. Apenas um deserto sem nenhum papel escrito. Parou na praça e pôs-se a pensar.
Nessa hora, avistou o antigo porteiro da editora, que agora vendia doces. Perguntou-lhe sobre os acontecimentos.
-Não há mais editoras nem livrarias.
O homem fez uma pausa.
-Na verdade, nem existem mais livros.
Granz despediu-se e passou a caminhar pelas ruas de pedra, aturdido. No caminho, pediu a uma passante que lesse qualquer página do seu manuscrito. Esta não parou, recusou-se prontamente, e partiu para seu destino. Contrariado, retomou a marcha até encontrar o prédio da biblioteca do estado. Nele, ainda havia uma lâmpada acesa, que despontava suntuosa no escuro da noite que já se fazia. Porém ela durou pouco, e logo desapareceu. Sem mais ânimo, ele guardou o manuscrito no fundo de sua bolsa e voltou para casa, enquanto na rua os carros seguiam perigosos e céleres a melodia estridente de suas buzinas obtusas.
Victor Leandro
Nós professores não podemos deixar a leitura e escrita morrerem.. pois, se deixarmos acontecer... a ignoracia dará a carta final desse jogo literário.
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